Não precisa olhar para um passado tão distante, afinal a redemocratização do Brasil após o golpe militar de 1964 teve início em 1985 e consolidada com a Constituição Cidadã de 1986 e eleições diretas para Presidência da República em 1989 colocando no poder Fernando Collor de Mello (PRN).
Somos um país de jovem democracia ainda, com apenas 39 anos, se comparado, por exemplo, com os Estados Unidos que soma 235 anos desde a eleição do seu primeiro Presidente da República. Porém, o Brasil aprendeu rápido em como se livrar de mandatários dentro das quatro linhas, ou seja, golpes sem uso de armas, mas com pelo menos dois dos três poderes muito bem sintonizados, legislativo e judiciário.
A história mostra que Fernando Collor foi afastado pelo Congresso Nacional em 1992. Qual seu crime? Seu irmão, Pedro Collor fez graves denúncias sobre esquema de corrupção tendo PC Farias como operador. Para não ser cassado, o Presidente renunciou ao mandato. Porém, 22 anos depois ele foi absolvido pelo Supremo Tribunal Federal de todas as acusações: peculato, corrupção passiva e falsidade ideológica. No entanto, há quem acredite que o estopim de tudo foi o pacote econômico que incluiu confisco das poupanças, levando brasileiros à falência e ao suicídio. Nesta época surgiram os Caras Pintadas em protesto pelas ruas e avenidas de todo o país.
O segundo "golpe" veio em 2016 com o impeachment da Presidente Dilma Rousseff (PT). Acusada de “pedaladas fiscais” com o Plano Safra 2015 e suplementações orçamentárias por decretos, acabou apeada do poder. Juristas renomados, no entanto, afirmam que não houve crime de responsabilidade. Uma das provas disso é que, diferente de Collor, que perdeu os direitos políticos, os seus foram preservados. Durante o voto, parlamentares que votaram a favor da cassação do mandato justificaram apenas que seguiam orientação dos seus partidos. Michel Temmer (MDB) assumiu o mandato e ainda hoje é conhecido como o articulador do “golpe”. Em março de 2022, o Tribunal Regional Federal da 1 Região inocentou a ex-Presidente das acusações que a levaram a perda do cargo.
Agora, nunca as investigações contra os atos antidemocráticos de 8 de janeiro estiveram tão perto do ex-Presidente Jair Bolsonaro (PL), um dos alvos da Operação Tempus Veritatis deflagrada ontem (8) em 10 estados. Aliados políticos e militantes bolsonaristas negam tentativa de golpe, mas que a invasão dos prédios dos três poderes em Brasília foi inconformismo de uma parcela da população com o resultado das urnas que elegeu Lula (PT) para Presidência da República.
Um dos argumentos é que não poderia ser tentativa de golpe de estado por não haver uso de armas ou apoio do Exército, apesar dos vários acampamentos em frente aos quartéis. Esquecem, no entanto que, faixas pediam “intervenção militar com Bolsonaro no poder”. Todo o movimento era uma forma de sensibilizar as Forças Armadas para agir, o que não aconteceu também pela baixa adesão dos militantes e dos próprios militares.
Agora, as investigações da Polícia Federal apontam para uma orquestração que, se fosse executada, poderia acabar com decretação de um estado de sítio e da garantia da lei e da ordem no país. O documento foi encontrado na sala do ex-Presidente Jair Bolsonaro na sede do Partido Liberal. Como se vê, e a história comprova, para um golpe de estado (ou tentativa) nem sempre é preciso de canhões nas ruas e nem o disparo de um único tiro. Assim, atos antidemocráticos podem ser democraticamente validados, desde que tenham apoio de dois dos três poderes.
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