Nas redes sociais não faltam vídeos que mostram gatos adotando patinhos ou até mesmo cachorro que passou a cuidar de um porquinho órfão. Casos assim não são raros. Há também situações em que pets acolhem objetos como se fossem filhotes. Foi o que aconteceu com a nossa cadela. Apesar de tudo isso parecer engraçado a situação é séria e pode trazer graves consequências.
Flor tem quatro anos e é SRD (Sem Raça Definida). Há 10 dias trouxemos para casa uma bolinha de borracha, dessas que faz barulhinho quando apertada. Ao ouvir o som, ela colocou a bola suavemente na boca e passou a cuidar, escondendo e “protegendo” da nossa outra filhota, a Julie. A princípio não ligamos muito, mas na manhã seguinte observamos mais atentamente seu comportamento e chegamos a conclusão de que ela adotara aquele brinquedinho e estava desenvolvendo uma gravidez psicológica.
“Fiquei ainda mais preocupada quando percebi que ela começou a ficar com a boca trêmula, andando pela casa como se estivesse procurando algo, chegando depois a produzir leite. Achei por bem esconder a bolinha e depois consultei o adestrador do Canil da Polícia Militar do Piauí, Cabo Bruno Alencar. Ele disse que foi o correto. A princípio ficou triste, mas aos poucos com carinho e atenção fomos distraindo a Flor. Também falei com o veterinário dela que pediu para observamos seu comportamento pois há casos em que o pet pode entrar em depressão. A solução definitiva seria castrar”, explica a tutora Selma Figueiredo.
Flor não ficou agressiva conosco, mas rosnava para a Julie. Com a gravidez psicológica as mamas ficaram cheios de leite e ela passou a mamar em si mesma. Esse foi outro motivo de preocupação porque abre uma possibilidade para doenças graves e fatais para os pets. Nesta segunda-feira (23) nossa filhota será castrada e a partir dai uma série de problemas devem ser evitados. Portanto, fique sempre atento aos sinais dados pelo seu amiguinho de quatro patas.
Veja neste link como ela protege a bolinha: MINHA CACHORRA TEVE GRAVIDEZ PSICOLÓGICA AO ADOTAR UMA BOLINHA. E AGORA?
Nesta entrevista com o veterinário Márcio Ricardo aprofundaremos o tema e traremos dicas preciosas sobre cuidados e tratamento em caso de gravidez psicológica.
ON – Isso é raro de acontecer?
Dr. Márcio – Não é raro. Na verdade é uma rotina, um comportamento inerente à espécie. Os cães têm a pseudociese, comumente chamada de falsa gestação. Não é uma patologia, mas provoca um grande distúrbio de comportamento na cadela. Se sentem mal, um incômodo de não compreender aquela situação e desconforto, estresse para o cão e para o tutor. Algumas cadelas desenvolvem produção de leite. A única solução para prevenir esse problema é a castração.
ON – Neste caso ela adotou uma bola, diferente de outras situações em que se adota animais de outra espécie. Porque isso acontece?
Dr. Márcio – Porque o cão não sabe que aquilo é uma bola. O cão é um animal que agrega. Ele é único. Nessa situação os hormônios fazem a cadela agir como agregador. A mãe dá o afeto. Então ela encontrou o artefato bola, é meu filhote e eu vou cuidar. Isso pode acontecer com outra espécie, animal ou objeto.
ON – Ela desenvolveu a produção de leite e acaba mamando em si mesma. O que fazer em caso desse?
Dr. Márcio – Existem duas medicações. Mas, se o estímulo persistir a cadela continuar mamando vai continuar produzindo leite. Então, ou tenta-se evitar que ela continue com o ato de mamar com colar associado com a medicação e a castração. É inerente à espécie. Muitas cadelas que entram no cio, com a influência hormonal podem desenvolver a falsa gravidez.
ON – Caso não se tome providências e a produção de leite continue, pode vir a desenvolver doênças?
Dr. Márcio – Sim, o câncer. Produção excessiva de leite e empedramento da mama. A cadela não tá tomando o leite, mas estimulando a produção, mordendo a glândula. Se ela deixar de mamar vai empedrar porque também não tem o filhote. Então, o melhor é tomar uma conduta rápida com um colar para que o cão não continue com o ato para não estimular as células a produzirem mais leite, tratando com medicamento e depois castração.
ON – As pessoas podem achar engraçado e ver como uma brincadeira o cão adotar um animal ou objeto. Neste caso, não dar importância e buscar tratamento é um erro que o tutor comete?
Dr. Márcio - Com toda certeza. Terminam humanizando aquilo. Nossa a cadela adotou, que bonitinho. De forma alguma. Vamos ter empatia e nos colocar no lugar desse indivíduo. A cadela está sofrendo e não consegue entender. Ela precisa de apoio e a família precisa entender o que está havendo para que possa tomar a melhor decisão.
ON – Então, só tirar o objeto ou animal que ela adotou não resolve?
Dr. Márcio – A família precisa entender que cada manejo é muito especializado. Infelizmente as pessoas tendem a tomar uma decisão sem apoio. Cada indivíduo terá uma resposta para uma ação. Se eu tirar abruptamente o objeto pode ser que a situação piore. É melhor ter um manejo especializado para aquele indivíduo e para isso nada melhor que o veterinário para acompanhar, entender o comportamento e daí preconizar o protocolo para aquela cadela.
ON – Psicologicamente o animal fica afetado com a falsa gravidez? Que comportamentos pode desenvolver com esse manejo errado?
Dr. Márcio – Agressividade, depressão, infecções porque a imunidade vai baixar, piometra. O manejo não pode ser uma ação, ele é polifatorial. Tenho que entender bem aquilo e a família muito bem orientada sobre as causas e como agir especialmente para aquele indivíduo.
Fonte: Wesslley Sales